segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Fábulas: # O Concerto derradeiro...

O nonagenário maestro romeno Rubin Rabesco anunciou que iria morrer ao final daquele concerto, exatamente no chapar derradeiro dos pratos, mas anunciou somente ao spalla da orquestra, o trintagenário violinista belga Elois Chambertan, advertindo-o de que se algo desse errado, que se por um acaso ele batesse as botas antes do previsto, que ele próprio assumisse o posto de regente e seguisse com a música até o seu final, quando os pratos decretariam o fim do concerto. Pois o concerto mal começou e o que se viu foi o nonagenário maestro romeno Rubin Rabesco ser acometido por uma torção convulcional que o fez despencar do púlpito, morto nem bem o primeiro compasso havia acabado. Pois o spalla da orquestra, o trintagenário violinista belga Elois Chambertan, - que antes do início do concerto havia avisado o seu companheiro de estante, o quarentão e também violinista (armênio) Zachar Schinni, que se algo desse errado e ele precisasse se ausentar da sua função de spalla, que ele ocupasse a sua cadeira de comandante dos músicos e continuasse a música até o seu final, quando os pratos decretariam o fim de tudo -, pois então ele, o spalla Elois Chambertan, rapidamente galgou o púlpito e tratou de assumir a batuta, mas nem bem havia vestido as vezes de maestro e ele próprio convulcionou rolando púlpito abaixo bem ao lado do corpo já frio do nonagenário maestro romeno Rubin Rabesco, morto ele também. O que se viu foi, então, o quarentão e também violinista (armênio) Zachar Schinni pular para o púlpito e assumir a batuta, coisa que não durou muito pois ele também viu-se morto após breves instantes em que havia tomado para si a batuta. E então, assim, num perfeito mecanismo de revezamento coordenado, todos os músicos, cada qual em sua vez, trocavam de lugares de acordo com o decoro da importância melódica de seus instrumentos a título de não deixar a sinfonia morrer, e, eles próprios, cada qual em sua vez, morrendo após tocarem na batuta. Cordas, metais, madeiras foram se extinguindo como repolhos colhidos na horta, e formando no palco uma espécie bastante concreta de cemitério, até que, por fim, sobrou apenas o pratista da orquestra que, na dúvida do que fazer - reger o vazio ou tocar o seu instrumento - deu preferência à música e contou silenciosamente as pausas até que, depois de quase vinte minutos mergulhado no mais absoluto silêncio, ouviu-se, por fim, o chapar vigoroso dos seus metálicos pratos, pondo fim, então, ao concerto da noite.


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