sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

SHAKESPEARE SONETO, by Bob Wilson.


Quando a tagarelice do discurso moralista é trocada pela poesia do espaço, do som, do movimento. A força do teatro não está naquilo que é urgente transmitir, mas na habilidade de sugerir imagens. Viva Bob Wilson, Viva Shakespeare.

terça-feira, 16 de março de 2010

Curso Polishop Mãe Dinah.


Garanta já o seu curso de futurologia da Polishop. Com um investimento único você recebe um controle remoto para sintonizar a novela "Viver a Vida" e já começa a trabalhar nas previsões. Em alguns minutos você já será capaz de notar o seu progresso: A bêbada continua bêbada, a megera sempre megera, o queridinho da mamãe termina a noite como o queridinho da mamãe. Batata! Em alguns dias você já estará craque ao ponto de saber o que aconteceu sem precisar ligar a TV! E mais! Basta uma única temporada inteira para chegar ao nível avançado, que consiste na seguinte conclusão: o primeiro capítulo vai ser exatamente igual ao último que será precisamente uma cópia da futura nova empreitada de Manoel Carlos no próximo folhetim! Garanta já o seu curso de futurologia da Polishop e se torne a Mãe Dinah da dramaturgia televisiva!
Escrito por Francisco Carvalho, terça feira - 16 de março de 2010.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

BB-B(ergson).


Desisto! A despeito de todas as advertências anunciadoras da ética e da moral dos bons costumes, adversários dos dissabores de uma vida mergulhada na sodomia dos prazeres tidos como proibidos, eu entrego-me ao pecado de corpo e alma em uma rendição voluntária ao espetáculo voyerista chamado Big Brother Brasil. Ufa, sou culpado!

Culpado mas não degenerado (será?), explico.

O desfile de corpos nus misturado a tagarelice de pensamentos fúteis não são os principais atrativos ou novidades desse espetáculo da vida cotidiana, a dramaturgia da maioria dos programas de TV faz uso há tempos do mesmo disco riscado na ânsia por índices elevados no Ibope. Os enredos folhetinescos da nossa política também indicam que já estamos devidamente imunizados contra eventuais pornografias do corpo e da língua.

Onde está a graça da coisa então?

Repique da bateria. Ziriguidum!

O batuque que torna o BBB irresistível é aquele que usa um mesmo refrão já consagrado pelos passistas do jogo: "Não importa o que aconteça, vou ser quem eu sou!".

A letra assinada pelos participantes tenta de todas as formas fazer-nos crer da existência de consciências previamente trabalhadas que funcionariam como armas de batalha na conquista pelo prêmio. O que todos evocam ao entrarem em contato uns com os outros é um proveitoso período de estágio anterior responsável por estabelecer a seguinte máxima:

"Haja o que houver, continuarei a ser como sou, alguém que observa e concebe o que acontece pelos olhos da minha identidade, escudo inviolável e íntegro!"

A idéia de entidades concebedoras do mundo a partir de um "eu" central não faz mais do que reunir em um mesmo palco de dança um conjunto curioso de consciências diversas, cada qual convencida de que a sua estratégia é a que reproduz de forma fiel o que os olhos entendem por realidade.

(Pirandello compôs ótimos sambas enredo com esse tema!)

Tendo em vista que o período de preparo, esse tão divulgado vestibular do caráter, nunca é igual, o que temos a oportunidade de conferir é um saboroso bailado de personagens que insistem em ensinar uns aos outros os melhores passos de um gingado que nem a música de fundo já poderia autorizar.

A delícia está em constatar que o ritmo dos pés não é comandado senão pela cadência da música. Cada um não é mais do que um par de botas que reage de acordo com o balanço da melodia. Não são simples marionetes, é verdade, a dança permite a contribuição de novos passos, inclusive induzindo a uma mudança de ritmos, mas tudo isso a partir de um contato com a música que toca no instante presente e não por uma aplicação de partituras decoradas no passado.

Para Bergson o equívoco maior está em compreender o mundo como reflexo de consciências abastecidas por um espírito interior, separado do próprio mundo. Para o filósofo francês o homem não é mais do que um centro motor que funciona ao receber, processar e reagir aos movimentos que são percebidos pelo universo material. Nosso corpo é uma imagem privilegiada, sem dúvida, mas não deixa de ser imagem refletida no mundo que a originou.

Somos todos dançarinos e executantes de uma música apreendida fora de nós e reelaborada pela atualização no presente de passos marcados na memória interna, longe de uma posição de destaque em alguma arquibancada reservada a jurados capacitados.

A máscara, entidade demonizada pelos BBB’s como sendo o último golpe de violação à pureza do caráter, nada mais é do que a materialização simbólica da condição que não nos escapa: centros motores que percebem o mundo selecionando imagens e devolvendo a ele algo que é refletido daquilo que recebeu como estímulo – um processamento incessante e nunca inviolável de passos a serem escolhidos dentro do mundo e não distante dele.

Quem diria? Big Brother Bergson! Um programa imperdível!


Escrito por Francisco Carvalho, segunda-feira, 1º de fevereiro.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Sobre a neve.


Lancei um olhar através da janela fazendo com que minha atenção ultrapassasse o quarto aquecido em que eu estava para o frio gélido da neve que caia fazia horas. Lá estava ele novamente, retirando o grosso tapete branco da frente da sua garagem, sempre com uma dedicação religiosa de fazer inveja ao compasso firme da ladainha das rezadeiras.

Nunca engoli essa história de Paraíso. Campos floridos cortados por rios que vertem leite e mel não me parece um cenário de delícias, nem para o estômago e tanto menos para o espírito. Se o estômago responde mal aos derivados de laticínio, a alma em igual medida corre o risco de enjoar com o vislumbre de uma eternidade enquadrada em uma paisagem idílica.

Que seja feita então a minha vontade. Fosse para escolher um destino derradeiro, a última parada para todo o sempre, preferiria entrar na fila para garantir o meu lugar no andar de baixo, ao lado do Cão. Se o demo fizer jus ao apelido, dedicaria tranquilamente meus dias eternos a tarefa de levá-lo para passear – sou fã incondicional dos nossos amigos caninos, esses sim merecedores de alguma atenção divina.

Somente em um aspecto o Jardim do Éden poderia fisgar-me nessa disputa entre resorts post mortem, e a esse fato não há garantias, apenas suposições. Uma vez que o inferno atrai as atenções pelo calor escaldante das suas acomodações, o Paraíso, por dedução, deveria polvilhar flocos de neve em seus campos floridos, transformando em sorvete cremoso os rios de leite e mel. Mais apetitoso, sem dúvida! Respeitando o maniqueísmo metafísico do bem contra o mal, nada mais justo do que imaginar tal oposição climática, com Adão e Eva enrolados em cachecóis e pantufas a observar a cobra anunciando entre tremeliques de frio:

"Nessa pista de gelo jamais patinarás, sob a pena de escorregares e sucumbires de loló ao chão".

E lá se foi a Eva. E deu no que deu.

E aqui estou eu, nesse Paraíso branco, olhando através da janela. E lá está o mesmo senhor que há dias trava sua luta contra as intempéries dos açúcares granulados, excesso de capricho dos deuses que em júbilo celebram a alegria de saborear o doce prazer da vida. Tudo aqui parece respirar a felicidade, os esquilos saltitam fazendo ondas com seus rabos enormes, os coelhos eriçam suas orelhas a noite, e, como em uma sinfonia silenciosa, a neve executa um bailado de timbres e alturas que encantam qualquer um que se preste a contemplá-lo.

Eu estou no Paraíso e ainda assim tenho total convicção de que não demoraria muito tempo para que toda essa felicidade enjoasse a minha paciência. Lembro-me de uma entrevista impressa em algum jornal com o escritor Milton Hatoum em que o autor afirmava ser impossível escrever romances tendo como vista um lago suíço cristalino. Só é possível ter inspiração para falar sobre a vida se o cenário ao redor estiver adequado a confusão que traduz o sentido de viver. São Paulo, para Hatoum, com o seu Tietê mal cheiroso, é mais apetitoso do que os alpes europeus.

A idéia de um Jardim do Éden perfeito, terreno acolhedor e harmônico onde Deus está em absoluta comunhão com a sua criação humana é frustrante porque não há aí a idéia de movimento. Tudo está pronto, pronto e estático, enfim, morto. Muito mais interessante seria imaginar um roteiro de fuga das alfinetadas do capeta, ou então estratégias de contra ataque aos golpes lançados.

A felicidade, portanto, não pode ser resumida a um estado de desfrute, mas na atitude de busca por um instante de alívio e, para isso, é primordial partir de alguma instabilidade. O que é instável gera movimento, e é pelo risco de cair e me esborrachar ao chão – porquê sempre haverá esse risco – que me vejo alcançando a plenitude de um sentido de felicidade. Sentido traduzido sempre pela busca, mais do que pela conquista.

Em breve, depois de um proveitoso estágio no Paraíso, estarei de volta ao Brasil, dessa vez ainda mais consciente de que nosso país é um dos terrenos mais férteis do mundo justamente porque dispõe aos seus habitantes condições de equilíbrio precárias, suficientes para gerar um estado de atenção distante da monotonia celebrativa.

Ainda em tempo. O senhor que observo da janela do meu quarto faz uso de um veículo motorizado para expulsar a neve da frente da sua garagem. Sempre repete o mesmo itinerário, empurrando o aparelho na mesma direção, com a mesma força empenhada. O resultado é sempre o mesmo: um chão limpo e impecável, livre das inconveniências do gelo. Sempre feliz, sempre esbanjando o mesmo sorriso na face, satisfeito consigo próprio. Há poucos instantes eu estava defronte a garagem da casa onde estou hospedado com uma pá na mão, contemplando o resultado do trabalho que me deixara com o corpo inteiro moído e suado. Ainda havia rastros de gelo e neve no chão. Cocei a cabeça e entrei para o calor do interior da cozinha já pensando em qual diferente tática colocaria em prática no dia seguinte. A batalha contra a neve para mim é sempre uma novidade, amanhã talvez eu escorregue, quem sabe?

Escrito por Francisco Carvalho. Canadá, 2010.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

A Noite do Aquário

Texto de Sérgio Roveri.

Direção de Sérgio Ferrara.

Elenco:
Clara Carvalho,
Chico Carvalho e
Gustavo Hadadd.

Produção: Élder Fraga.