Era professor; sempre fora professor. Era o que lembrava ser
desde o dia em que se soube alguém: um professor que galgava as horas
empilhando tijolos da astúcia intelectual como se a sapiência formasse o
cimento fundador de toda uma Babel de utilidade pública e íntima. Certa vez, já
bastante acimentado na certeza de que o céu dos eruditos não é nada rarefeito
de brisas refrigéreas em comparação aos que rastejam no limbo lamacento do chão
batido, viu que o vigia da rua de terra por onde fazia desfilar seu carro feito
tílburi puxado por alazões emplumados morrera de ataque repentino.
Candidatou-se ao cargo. Desejava fortemente experimentar a filosofia dos que
nada precisam falar, explicar, comparar, enfim, daqueles que existem
simplesmente para mirar o nariz ao horizonte sem a obrigação de aspirar poesia
onde rima alguma dá conta de rimar, senão o próprio tédio dos ares que embalam
o fluxo ininterrupto da vida. A posse do novo cargo não foi ocasião digna de
serpentinas pela vizinhança, ao contrário, houve quem lhe atribuísse certa
espécie de demência acadêmica, moléstia que atinge especialmente aqueles que
forçam demais a mente por longos períodos ininterruptos, eclodindo grave revolta
do corpo que por tanto tempo vira-se atado à ditadura das sinapses dos miolos.
A verdade é que silenciara por completo, preenchendo seus monólogos
contemplativos com longas meditações sonolentas, vagares noturnos e trotes nada
ágeis. Os vizinhos que o espiavam em sua nova labuta tomavam-o com pena, até
mesmo despertando aquela espécie de piedade generosa que somente os miseráveis
sem salvação podem acionar no pior dos engomados. Cercaram o ex-professor de afagos
caridosos e polpudas cestas de guloseimas, e isso até a presente data, quando o
novo vigia veio a juntar-se ao antigo, companheiros de piripaques repentinos e
sócios em vai saber qual dimensão oculta.
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