Ao ator de gestos expressionistas e voz cavernosa pediram
que fosse natural, ao que ele respondeu ser naturalmente impossível, haja vista
que tudo o que é natural foge à mentira a que se propõe a ficção, concordamos
nisso, disseram, mas se a ficção parte da vida e a vida é aquilo que podemos ver
e sentir como coisas naturais, é seu dever também eliminar os exageros a ponto
de poder ser verdadeiro nas suas ações, a verdade é terreno impossível, contra
atacou, e ainda que eu a tentasse raspar estaria incorrendo naquilo que
acredito, ou seja, na mentira forjada pelos meios a que disponho. Então a vida
para você não é o que ela é, ou melhor, é isso que afirma ser: uma grande
farsa? Sem dúvida alguma ela é o que ela é: um teatro de proporções
gigantescas, e meu respeito a ela é uma mera formalidade, sem reivindicações
outras senão nutrir-me das suas idiossincrasias aumentando um pouco o volume
daquilo que por si só já se mostra fora de qualquer equilíbrio, mas nunca lhe
passou pela cabeça agir de forma simples e sem enfeites para poder comunicar
uma simples ideia? E desde quando é matéria do meu ofício ser simples? ou
melhor, a simplicidade evidentemente é uma qualidade almejada por todos nós,
ainda que seja o atributo mais difícil a ser alcançado, mas o que me pede, se
eu bem entendi, é outra coisa, mais ou menos isso: seja direto! Isso mesmo! Porque
dar curvas ao redor de um sentimento genuíno que é o que mais importa para um
artista? Novamente essa história de verdade! Nada em mim é genuíno. Em nada sou
transparente. O meu sentimento nunca esteve em jogo, e se há algum desejo que
me acompanha, a ele dou o nome de invisibilidade. Pois então como é que você se
propõe a emocionar as outras pessoas se a si próprio nomeia essa absurda
característica de insensibilidade? Emocionar as outras pessoas? Nunca quis
isso, meu trabalho não é fazer derramar lágrimas, se como resultado do meu
ofício isso ocorrer, em nada tenho eu responsabilidade! E o que faz, então? Por
que resolveu ser artista? Respostas, é o que me pede sempre com suas perguntas!
Eu não as tenho, essa especialmente é impossível de responder. Existo, ou tento
existir, dou forma a um discurso ao invés de tentar decifrá-lo, sou uma parte
do mundo e não o mundo inteiro, e isso basta para mim: fazer a manutenção do
mistério. Não te entendo. Bom, já temos um começo...
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