Sucumbi à pressão e fui ver os impressionistas no centro de
SP. Escolhi minha melhor roupa para impressionar e... tcharãn... impressionei!
Olhava pro Monet que olhava pra mim e ambos faziam aquela cara de
im-pre-ssio-nan-te! Eu porque admirava os lindos quadros impressionistas do
pintor, ele porque ficou impressionado com a minha expressão de filósofo do
impressionismo tardio. Já reparou que nessas ocasiões, de grandes exposições
cujos autores são artistas renomados, há um afluxo alucinante de Phd’s em vanguardas-emergentes-do-contexto-sócio-geo-político-da-conjuntura-mundial-do-pós-guerra?
É quase proibido ser uma anta e ainda assim pedir ingresso num desses eventos,
uma capivara sim! – porque as capivaras tem a sorte de carregar aquela
expressão ‘un passant’ típica do ruminante que não se impressiona com nada do
que vê, embora entenda perfeitamente toda a cronologia impressionista do
movimento dos artistas em questão. Nunca desconfiou porque razão legiões de
capivaras circulam as margens do Tietê e do Pinheiros? Simples, porque os
nossos dois queridos rios formam juntos a maior obra abstracionista e fedorenta
– porque toda arte que se quer moderna deve em algum momento exalar um odor
nauseabundo, nem que seja um ligeiro budum-poético - que nossa capital da fumaça
já produziu. Eu era uma capivara declarada na exposição dos impressionistas. Uma
capivara-cult. Uma capivara assídua do espaço Unibanco, que veste boina e
chinelo e sabe tudo do neorrealismo italiano, além de ser fã dos filmes do
Godard. Mas não me pressione a mudar de assunto! Se eu sou uma capivara
assumida, naquele instante eu não era uma capivara da 7ª arte, mas uma capivara
das artes plásticas, impressionada com os impressionistas. É por isso que eu
não sou afeito a visitas em museus, prefiro preservar minha porção capivara
para momentos campestres, em que é possível mastigar a mais fina alfafa
interiorana, capivaras urbanas são quase sempre contaminadas pelo ar da
erudição-capivarial, aquela sapiência zoomórfica que domina as cátedras
acadêmicas dos orientadores de doutorado. Prefiro ir ao teatro. Na platéia do
teatro as antas são bem vindas. No teatro eu sou uma anta. As antas no teatro
não correm o risco de sofrer qualquer espécie de bullying-intelectual. O melhor
público é o que se assume ignorante, tapado, desorientado... ainda que o
sujeito seja uma Toupeira-Shakespeariana – um grau além da antice esperada -, o
palco é tão potente que dará conta de arrebatá-lo para dentro da história do
bardo inglês. Nenhum pós-doc sobrevive a um espetáculo de teatro, o maior dos
instruídos vira mais um numa audiência repleta de espectadores transparentes.
Mas a despeito de tudo isso, vale a pena ver o Monet e todo o resto dos
impressionistas, só tome cuidado para não tropeçar nas montanhas de capim que
vez ou outra se formam durante o trajeto das capivaras...
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
domingo, 9 de setembro de 2012
O Focinho empreendedor...
Entre os animais houve um rateio de profissões e coube a
pomba o papel de lixeiro do mundo. Pobre coitada da pombinha que tem de
sobrevoar as metrópoles malcheirosas do mundo em cumprimento ao seu árduo
ofício. Mas a natureza é sábia e Darwin, chefe-mor do Poupatempo-zoológico, não
titubeou em carimbar a carteira de trabalho de cada bicho de acordo com o
focinho do candidato. E não é que ele tinha razão? Já imaginou um albatroz
elegantemente estacionado no topo da Catedral da Sé só à espera de uma lasca de
churrasco-grego atirada inadvertidamente ao chão? No instante em que esse
boing-penoso alçasse vôo em direção ao lanche desprezado, todos os camelôs
teriam forçosamente que recolher suas barracas made-in-Ponte-da-Amizade sob o
risco de darem adeus às suas mercadorias, engolidas pela lufada de ar das asas
do gigante destemido. O rei dos animais não poderia ser outro senão o leão, a
juba é que lhe dá esse direito! Tose o colarinho de um leão num pet shop da
esquina e ele voltará para o seu lar no máximo como um motoboy a serviço do
rinoceronte. Imagine se a girafa, com aquela cara de Mister Bean de pescoço
avantajado, poderia pleitear um cargo de respeito na repartição da savana
africana? Jamais! Aliás, é desse estigma que padece a hiena. Teria de tudo para
virar um bicho de dignidade irreparável não fosse sua risada de taquara rachada.
O cachorro só é o melhor amigo do homem porque não fala, no instante em que um
totó abrir a boca para comentar sobre as perspectivas em torno do futuro dos
acusados do mensalão ele perderá seu emprego de Sancho Pança da raça dos
sapiens. Na empresa da terra, os animais não falseiam, desempenham a tarefa que
lhes foi entregue e isso basta. Diferente de nós, humanos, que estamos o tempo
inteiro atrás de uma revisão a respeito do que somos ou poderíamos vir a ser. Essa
coisa chamada consciência vive nos pregando demissões por justa causa, nunca
satisfeita em ser o que é, porque já essa certeza – a de ser alguém, nos escapa
a cada instante. A regra é fingir, falsear, driblar, escamotear, constantemente
num exercício camaleônico de busca pelo emprego ideal que se encaixe na perfeição
dos nossos desejos. Nunca será encontrado. Darwin é o nosso inimigo mortal, não
há ocupação que combine com esse focinho empreendedor.
sábado, 8 de setembro de 2012
Somente o clips prevalecerá!
O clips prevalecerá! Para além de todos os esforços humanos,
será o clips o herdeiro da nossa mais bem sucedida passagem pela terra. O
sujeito que inventou o clips é um gênio, receberá como recompensa o merecido
descanso no reino dos escolhidos, sim, porque na corte do juízo final deve
haver um espaço importante para avaliar as patentes, e, nesse caso, por mais
libidinosa que tenha sido a vida do criador do clips, o autor desse pequeno
objeto metálico retorcido será salvo, deixando a nós, simples mortais incapazes
de inventar algo de grandeza comparável, entregues ao limbo fedorento do
capeta. Imagine a seguinte cena – o pai do liquidificador tentando convencer o
Todo Poderoso a lhe dar uma quitinete no paraíso, alegando que seu filho de pás
metálicas, motor elétrico e jarra acrílica foi um fiel servidor dos interesses
mundanos... pobrezinho, será triturado como uma vitamina de orgulho pecaminoso
no instante em que se deparar com seu concorrente maior ao posto de jardineiro
do Éden: o artista do clips! Insisto, nada nem ninguém poderá fazer frente ao
insuperável poder agregador de um clips, que embora um: clipe, já não se entrega ao singular, virando vários em um, exatamente como os peixes e pães multiplicados pelo filho redentor do Pai Celeste. Amém ao Clips, agora com maiúscula! Shakespeare só foi Shakespeare porque
em algum momento um clips medieval reuniu suas páginas poéticas num único
volume, evitando o que seria a maior tragédia não escrita de todos os tempos: A
revoada de palavras ao vento do esquecimento eterno... Hamlet se tornaria um
menino bobo em comparação a tamanho desastre, aliás, Hamlet não existiria,
assim como nenhuma dúvida metafísica poderia habitar em nós caso o clips não
tivesse sido inventado. Por que acham que Sócrates foi condenado a tomar
cicuta? Justamente porque o barbudo se recusava a por no papel aquilo que
pensava, insultando o clips como objeto dispensável às necessidades humanas....
veredito? Um processo em praça pública que o levou a morte, todo
circunstanciado em laudas e mais laudas, unidas de que maneira? Por um clips
grego, é claro. Pobre dos atores, poetas que desprendem o verbo da escrita,
creditando à garganta a sua potencia encantatória. Serão todos esquecidos.
Somente o clips prevalecerá! Nas futuras escavações, será o fóssil do clips que
testemunhará a nosso favor...
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
O Banheiro é o berço da filosofia...
O banheiro é o berço da filosofia, lugar de elucubrações
elaboradíssimas, arrisco a dizer que o ‘conhece-te a ti mesmo’ surgiu quando
perguntaram a Sócrates qual shampoo usar na hora do banho, o de cabelos secos
encaracolados, ou o destinado a cabeleira lisa passada na chapinha? E eis que o
filósofo devolve a batata quente ao ensaboado inquiridor: ‘conhece-te a ti mesmo
e saberás qual escolher, Dove reparador de pontas secas ou Pantene nutrição
total’; o trecho final foi surrupiado para dar a entender que a nossa filosofia
sempre foi fundamentada em temas metafísicos de seriedade suprema, mas de
metafísicos e sérios não temos nada, só a audácia de acharmos que somos
superiores a qualquer outra espécie que nunca teve de decorar a fórmula de
báscara para passar de ano no maldito ensino médio, ou fingir interesse no
julgamento do mensalão para justificar uma dignidade que nunca existiu em
nenhum de nós – às vezes me dá uma vontade louca de ter nascido um ouriço nas
Bahamas, um ouriço nas Bahamas tem a vida melhor do que a de qualquer um de
nós, mergulhado em tranqüilas águas quentes sem precisar se preocupar com o
Russomanno prefeito de SP ou mesmo em aprender logaritmo para provar aos
crustáceos circundantes de que ouriço que é ouriço sabe honrar os espinhos pontudos
que carrega... definitivamente um ouriço nas Bahamas tem uma vida melhor que a
nossa, freqüentadores de banheiros metafísicos. Mas voltemos ao banheiro. Hoje
de manhã tive uma experiência digna de nota, escovei os dentes com a pasta
close-up refrescância total sabor tutti-frutti, um bálsamo dos sabores bucais
que até agora desconhecia. Já reparou que a vida é assim mesmo? Alguns se
dedicam anos a fio dentro de um laboratório para encontrar o sabor exato do
tuttu-frutti dental (o hortelã-eucalípto é outra história!) de modo que você
sinta o prazer de pertencer a uma raça que se preocupa com tudo, até mesmo para
você ter o direito de não precisar se preocupar com nada, e é justamente nessa
ponta que eu me estabeleço. Nesse mundo de alquimistas das pequenas coisas eu
me coloco na posição de filósofo comedor de churrasco na laje, os outros que se
virem para inventar um fio dental talentoso que faça voar o resto de carne que
por ventura vier a estacionar nas frestas da minha dentadura... e é claro que
depois haverá sempre um banheiro metafísico com uma pasta dental saborosa à
minha espera. Às vezes eu tenho uma dó tremenda dos ouriços das Bahamas que não
podem desfrutar dos mesmos prazeres mundanos que eu...
quinta-feira, 6 de setembro de 2012
Ode ao umidificador...
Ganhei um umidificador de ar e minha vida mudou... em dias secos, ligo o meu umidificador; em dias não tão secos, também ligo o meu umidificador; em dias nublados, por que não ligar o meu umidificador? Já que toda hora é hora de ligar o seu umidificador, eu também ligo o meu umidificador em dias nublados; mesmo quando o mundo está virando um pão bolorento de tanta umidade, eu faço questão de ligar o meu umidificador. Umidificadores deveriam vir dentro da cesta básica, afinal, mesmo com o apocalipse batendo à porta, aquela fumacinha gelada e branca parece dizer: 'Ei, sorria, tá tudo bem, olha que delícia é a vida!' Parei com a terapia, agora é o meu umidificador que me ouve quando deito no divã...
A batalha das miudezas diárias...
Meditando sobre os dissabores dessa nossa triste vida, cheguei à conclusão de que vencer uma guerra é infinitamente mais fácil do que lidar com os pequenos entraves do cotidiano. Por exemplo, ontem estacionei meu carro bem próximo de uma pilastra, já imaginando que esse meu shape de faquir-do-rio-Ganges daria conta de se esgueirar para fora sem maiores problemas. Ledo engano... com metade do corpo já à salvo, eis que um pé resiste à tentação de abandonar o veículo e se engancha no vão entre a porta e a cadeira do motorista... ao tentar livrar o bendito cujo, meu bastonete de manteiga de cacau cai do bolso e rola galhofeiro para debaixo do automóvel (pequeno à parte: resgatar esse objeto era motivo de primeira ordem, tendo em vista que um cactus do Saara tem a pele mais sedosa e hidratada que a nossa, habitantes da capital da fumaça)... continuando, livro o pé e me abaixo para apanhar a manteiga fugidia e é aí que a mochila resolve despencar das minhas costas e espalhar todo o seu conteúdo no chão da garagem. Subo vivo ao meu apartamento e quando abro a porta a maldita maçaneta sai na minha mão... nem Winston Churchill saberia como consertar essa pequena peça da engenharia doméstica. Morrendo de fome, tento abrir um vidro de palmito que deve ter sido lacrado na época da santa ceia, porque mesmo evocando fervorosamente o espírito santo (ou o preto-velho do candomblé) a coisa insistia em permanecer fechada... resumindo, é muito mais fácil decolar no Enola-Gay e lançar uma bomba atômica no cocuruto dos comedores-de-sushi do que enfrentar a gincana diária da vida...
Marcha contra os pintassilgos...
Tem um maldito pintassilgo, ou o que quer que o valha, que insiste em pousar numa árvore próxima à minha janela para diariamente me convocar ao serviço de feirante antes mesmo do seu parente galo acordar. Já tentei de todas as maneiras avisar o desgraçado do pintassilgo, ou o que quer que o valha, de que feirante é a galinha-da-sua-mãe-me-deixe-do
é galinácea e sim herdeira das aves agourentas do inferno! Ando bolando um plano para abater o tal do pintassilgo, ou o que quer que o valha, e antes que a APDP - Associação de Proteção aos Direitos do Pintassilgo - venha me processar por crime contra à natureza, faço questão de redigir um convite escrito de próprio punho para que todos os defensores do pintassilgo desse mundo repousem uma noite no meu quarto para sentir na própria pele o que é ser intimado a carregar no lombo uma caixa de couve no CEASA, só peço que haja certa organização nesse procedimento para que minha humilde residência não se transforme na nova Aparecida do Norte, com legiões de fiéis ao pintassilgo vindo acampar em cima do meu colchão. Além do mais, há que se preservar a dignidade da raça humana, raça essa que trouxe aos seu pares figuras ilustres tais como Aristóteles, Sócrates, Ronaldinho Gaúcho e Gretchen, nomes infinitamente superiores à toda cadeia de pintassilgos que já voaram por esses ares esfumaçados. Portanto, chega de me sentir o Pato Donald tentando roncar feliz e agarrado ao seu travesseiro, vou seguir o conselho de Hamlet: 'o mundo está fora dos eixos. Maldito o dia em que eu nasci para pô-lo no lugar!'...
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