terça-feira, 4 de setembro de 2007

SOBRE SAPOS.

Depois de hoje, me ocorreu a seguinte reflexão:

O que é “aceitável”? O que é “permissível”? Quais botões devo apertar para me assegurar de que aquela determinada luz irá acender? E quais aqueles que devo prioritariamente evitar a título de receber em troca um sinal de “PERIGO”? Como mapear o terreno a ponto de que eu tenha a tranqüilidade suficiente para receber uma resposta minimamente programada? Como respirar aliviado ao saber que o meu estímulo encaixou-se em um retorno “degustável”, ao invés de parar atravessado na garganta de alguém? Esses questionamentos me fazem lembrar daquela máxima tão conhecida por alguns de nós, alunos, que ao longo desses quatro longos anos tentamos com nossas forças remar no contra fluxo: “O que é vendável”?; “O que é passível de audiência”? “Qual público quero atingir”?; “Será que a massa irá apreciar isso”?; “O mercado compra”?

Uma lógica cartesiana. 1 + 1 = 2. Isso mais Aquilo é igual a Aquilo outro e se Isso não for adicionado a Aquilo é bem provável que o Isso desmorone sobre o Aquilo. Estímulo resposta, causa e efeito. Não se pode mais pensar em produzir algo, em se colocar em uma atitude criativa sem antes mapear centímetro por centímetro as possíveis causas e conseqüências “Daquilo sobre o Isso”. E assim vai, medo atrás de medo, seja em razão da manutenção de um status profissional seja pelo motivo simples da busca por uma massagem alheia do ego. Ou pior, a equação da mesmice é tão corriqueira que a consciência da “indústria do que pode ser consumido” passa batida. E a lei permanece: vendeu? Passou pelo crivo da maioria? Não causou desconfortos? Sinal verde! Siga em frente! Enquanto isso, a individualidade é solapada pelo modelo.

Reportar esse contexto para a esfera do corporal é um engano. O corpo sabe, antes mesmo que você deseje querer saber, que sua mão ao fogo significa queimadura (reação de causa e efeito). O sensível é anterior ao racional e por isso o argumento não se sustenta. E é justamente no sensível que se encontra a minha busca, na tentativa de se resgatar o frescor descompromissado de um instante sem querer me preocupar com as elucubrações racionais do momento seguinte. Quero fugir da tão famosa frase: “O que você quer com isso”? Ou então: “Qual é o seu objetivo com isso”? Ainda pior: “Para que isso serve”? Todas remanescentes da tradição cartesiana, da tentativa racional de se buscar um sentido ou um fim, mesmo naquilo em que, por princípio, não se coloca na posição de utilidade. O que eu proponho é a inutilidade do instante, apenas uma história sobre sapos e, a partir dela, desfrutar do lirismo poético e do absurdo de um discurso saído da boca de sapos. Não busquem sentidos para os sapos porque os sapos não tem culpa de serem sapos e, se por alguma coincidência, os sapos se parecerem com humanos não é porque chamo os humanos de sapos (dedo em riste: “o que você quer com essa insinuação”?), mas, é simplesmente porque eu não conheço a língua dos sapos para poder traduzi-la, só restando o vocabulário dos humanos para contar a história. Humanizar os sapos é uma saída inevitável quando se quer contar uma história sobre sapos, assim como teria de humanizar o cano do meu chuveiro se quisesse contar a história de como ele sofre todos os dias com os vazamentos de água.

Não quero o racional, não quero o discurso do consenso porque não acredito na maioria (nem nas instituições!). Por isso uso a arte como a linguagem do sensível. Quero dizer exatamente aquilo que é dito e se você entendeu outra coisa é precisamente isso o que eu quis dizer. Não é preciso ir muito longe para afirmar que a linguagem da razão foi e é a responsável por inúmeros equívocos, mesmo aquela que aos olhos da maioria parecia ser a definitiva salvação para a raça humana (que já nasceu, desafortunadamente sem qualquer esperança de salvação). Não quero protestos, não quero levantar bandeiras e se você, através do meu texto, enxergou uma multidão empunhando estandartes de reivindicações é porque eu, de fato, pintei esse cenário, mas não em forma de manifesto, e sim em forma de fábula, em forma de ilusão, em forma de jogo. O texto é político porque não posso me furtar de atuar como um agente político, já dizia o nosso ancestral grego que o homem é por natureza um “zoom politicom”. Mas não ofereço um ato e sim uma sugestão, que será degustada por você da maneira como lhe convier, estou fora desse banquete.

Por fim, peço que façam um esforço para rir, para retornar ao prazer infantil do jogo e se divertirem com os sapos falantes. Não é a toa que a criança é o melhor exemplar de ator que qualquer adulto possa vir a conhecer. A criança ri do seu choro e chora do seu riso porque ao mesmo tempo em que se leva a sério ela sabe, em igual medida, que tudo não passa de uma grande brincadeira. E isso é uma atitude crítica que é perdida na maioridade. Todos se levam a sério e buscam justificativas naquilo que não precisa ser justificado. Aí começam os equívocos porque é nesse exato momento em que as individualidades esfarelam-se no rio dos modelos (DO MERCADO BROADCAST). Perde o homem que não consegue se enxergar na sua precariedade, imaginando-se único e poderoso, perdem os sapos que, dessa maneira, permanecem no anonimato.




Francisco Egydio de Carvalho.



4/09/2007.

Um comentário:

  1. Ol� Francisco!
    Eu sou a Kira, que tamb�m est� concorrendo a uma vaga de mestrado com o Eduardo Santos Mendes.
    Fiquei curiosa: sobre o que � a sua pesquisa? Como foi sua entrevista?
    Boa sorte para n�s dois!

    Kira

    se quiser esponder, meu mail � kirapereira@gmail.com

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