REESCREVER...

O que fazer senão reescrever?
A vida, que nunca se repete
Repete aqui, no pouco que dela apreendo...
Que tragédia é não poder ser original
Mas que outra genialidade há
Senão repetir o que de mais importante há para se falar?
Porque, no fundo, é isso:
Só existe uma coisa importante a se dizer
O que é? Difícil não é descobrir
O complicado é fazer-se ouvir
Quanto a isso, só um jeito de persistir:
Dizer!
Ainda que não haja quem nos ouça
Diga...
A resposta dos ecos já é uma resposta
E qual melhor audiência que o silêncio
Que a tudo concorda
Sem nada replicar?

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MORREREI...

Morrerei quantas vezes for necessário
Mas morrerei assim, de mentira
Para um dia poder dizer enfim
Eu vivi de verdade!

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SE VOLTASSE ATRÁS...

Se voltasse atrás
Músico seria
E a mim caberia
Uma música nova a cada dia...
Assim me entenderia:
Ferindo cordas, soprando palhetas
Ondulando o ar com poesia
Mas outras que não essas
Composta por dedos silenciosos
Ausentes de melodia
Ou tantas outras mais
Que por sentidos ocultos
Decifram sentidos outros
Que ver não se veem
Jamais...
Se voltasse atrás
Músico seria
Só para com a minha poesia
Poder dançar
Vendo-a no espaço
A rodopiar
Ah! Que maravilha seria
Em minha alegria
Podê-la tocar!
Se eu pudesse voltar
Voltaria
Um dia...

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UM PELO BRANCO NO NARIZ...

Um pelo branco visita-me de temporada em temporada
Eu, como quem não quer nada
Digo:
Vai-te, arauto da derrocada!
Sou fresco em versos
Se envelheço, ai de mim...
É pelas beiradas...
Funcionou!
Desembestou a ir embora
O pelo branco
Com um zapt da tesoura
Que lhe dei agora...

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RONDÓ...

A repetição
É a condição
Para desejos cumpridos
Ou realizados!
Repete-se a exaustão
Até interessante ficar
Algo que por original
Nunca existiu
Ou buscando-se encontrar
O que nunca houve por atenção dar
Sono desperta
Não havendo matéria para sonho nenhum sonhar..
A humanidade é um disco riscado
Desde os gregos o jantar é o mesmo
Quem souber repetir a receita
Adicionando seu tempero
As bonitas melodias
Por curtas e repetitivas que sejam
Tocarão fundo
Nos nossos mais escuros
E abscônditos
Ansejos...

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ARQUITETURA ANTES DE TUDO E PARA TUDO...

Cada vez mais acredito na arquitetura
Não só a dos prédios
Mas também a das linhas
Não há conteúdo que sobreviva a uma habitação medíocre
Um sinfonia só enche os olhos quando elaborada na sua matemática formal
Um palco errado pode acabar com a melhor das peças
Um romance é resultado direto da extensão dos seus parágrafos
Uma moldura já diz o que é o quadro, que sem moldura não seria sequer quadro
Um teto modifica quem nele se abriga
Reivindicar o contrário é partir do inverso
Querendo primeiro pensar no recheio
Sem haver a massa...

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CLÁSSICO ENTRE LINHAS...

Um título já é o livro
A capa, todo o romance
A forma do assunto é o que o assunto importa ser
Não há conteúdo que não se resolva em dois pulos
A forma escapole das missivas didáticas, sempre tediosas
Ela é, a forma, a própria coisa em movimento
Dinâmica
Instável
cambiável
A forma imprescinde do outro
O conteúdo completa-se, sozinho, na sua mensagem
Um é o arauto do jogo, a forma
O outro, o começo o meio e o fim desejáveis: o conteúdo.

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