domingo, 3 de junho de 2012

Não desbundo, nem solto a franga! Sou inglês...



Ele disse aquilo rápido, de repente, sem aviso prévio, assim como um peteleco no meio da orelha. Ninguém está pronto para um peteleco na orelha. Peteleco dói. Na orelha, então, dói ainda mais. Um peteleco pode ofender mais que uma muqueca na orelha. Eu prefiro ser chamado dos piores nomes a receber um peteleco na orelha. A dor moral não é nada comparada a dor de um peteleco. Mas o que recebi naquele instante não foi um peteleco, foi na velocidade de um peteleco, mas não um peteleco. Antes fosse um peteleco aquilo que estava prestes a receber. Aquilo doeu, acertou bem no alvo do meu eu. [Adoro enrolar o meu leitor no preâmbulo do texto só pra saber se ele gosta realmente de mim. Se chegou até aqui, é porque gosta. Eu gosto de ser amado, se não houver admiração por mim, nada feito. Se achou esse meu comentário arrogante e prepotente, vá embora! Desista de mim. Se quiser continuar é porque me ama. Adoro ser amado. Eu mereço!] Vamos ao que interessa! Cenário: dentro de um carro. Situação: Volta para casa depois de ir ao teatro. Personagens: Eu e + 3, não citarei nomes para não elevar à fama os coadjuvantes do enredo, afinal, eu sou o protagonista e o único com direito aos louros do estrelato. AÇÃO! Estava no banco de trás do veículo e o sujeito ao lado do motorista me lança aquilo que fazia tempo que não ouvia a meu respeito: 'o dia em que você desbundar você decola, só falta você desbundar...' Sempre ouvi a mesma coisa, desde os tempos da faculdade: 'desbunde, meu filho, só falta você desbundar'. Será que a razão de eu me encontrar nesse limbo miserável é porque eu não desbundei na minha juventude? E se eu tivesse desbundado aos 18 anos, hoje estaria rico e famoso? Meu Deus! Eu deveria ter desbundado e não desbundei! O tempo parou. Pausa dramática! Sentado no carro, virei uma esfinge egípcia de ódio com a minha recusa injustificável em desbundar nos idos anos do passado que não volta. Rapidamente passou um filme pela minha cabeça, desses que a gente vê quando está prestes a empacotar – primeiro o túnel com a luz ao fundo, depois o filminho-brega da sua triste vida em retrospectiva. Se no seu filminho a trilha sonora estiver a cargo do Michel Teló, peça pra pular a projeção, você vai direto pro inferno. Será que só o moribundo assiste a esse filme-de-presunto, ou convidados aparecem na platéia pra rir também da sua vergonha? Eu não quero convidado nenhum. A vida é minha. Só eu tenho direito de chorar ao ver o dia em que vomitei na mesa porque minha mãe obrigou-me a comer camarão. Camarão é um bicho-antenudo-do-mar, mais conhecido como barata-salgada, que nem na hora da morte irei perdoar! Do mar para as penas. A verdade é que desbundar tem a ver com soltar a franga. E eu não solto franga nenhuma, não sou obrigado. Onde está no contrato que é preciso, em algum momento da vida, soltar a franga? Não que eu não tenha uma franga presa sob os meus domínios, todos tem uma franga, mas soltá-la ao Deus dará pra virar frango de macumba na primeira encruzilhada... ah não! Franga minha eu preservo, dou de comer, faço dormir no meu travesseiro, ensino os bons costumes. Franga minha toma chá às 17hs, todos os dias. Minha franga é Chicken, porque eu sou inglês. Até a rainha da Inglaterra tem uma frangona por debaixo daquele vestido de realeza. Agora, pergunte pra mim quando foi que a rainha soltou sua Chicken-Queen pra ciscar pelos jardins de Buckingham... perguntou? Respondo: nunca! Inglês não sai por aí soltando a franga. Eu sou inglês. A cegonha me derrubou por acaso quando passava pelo Brasil, depois de tomar um tabefe tropical provocado pelo vilão El-Niño. Eu não tenho nada a ver com a Carmen Miranda. Não existe nenhum cocar de bananas no meu guarda-roupas. No carnaval eu viro uma freira carmelita. No meu guarda-roupas tem fraques, cartolas, bengalas e um cachimbo. Sou inglês. Só solto a franga depois da troca da guarda real, e na intimidade do meu toucador. Tem uma peça em cartaz que se chama ‘Macumba Antropófaga’. Não vou ver. Nem amarrado saio de casa pra uma sessão de macumba antropófaga. Não sou antropófago, com todo respeito aos modernistas. Sou antropô, se você quiser ficar responsável pelo pófago, o problema é seu, vá fagocitar o que quiser, mas longe de mim. Não rebolo e não faço macumba. Se macumba fosse coisa boa não se chamaria má-cumba, seria boacumba. É isso! Em tempos de macumba, quem prende a franga é rei! Sou o anti-desbundador assumido! Não desbundarei por nada nessa vida! Enquanto isso, o meu talento decola...

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