O destino de São Paulo está selado, um futuro nebuloso, um
futuro poeirento e funesto. No dia 21 de dezembro, data do próximo apocalipse –
anote no seu smartphone para não correr o risco de perder a celebração -, a
cidade da garoa sumirá por completo debaixo de toneladas e mais toneladas de pó
– passe o dedo na sua estante de livros e perceberá os sinais concretos dessa
tragédia iminente. Não, caro amigo de infortúnio, não adianta ligar para sua
faxineira, ela pouco teria a fazer para nos ajudar. O pó vencerá! Do pó viemos,
ao pó retornaremos. O pó na estante é a primeira trombeta do apocalipse segundo
São Paulo. Ainda que as forças armadas empunhem o conjunto total de aspiradores
de pó à venda nas Casas Bahia, ainda assim, o pó triunfará! Será o fim. Seremos
todos sepultados vivos num piscar de olhos, sem nenhum aviso prévio! Nada de
hecatombe hollywoodiana com direito a terremoto engolindo o Monumento às
Bandeiras, labaredas de fogo queimando as capivaras do rio Tietê ou chuva de
meteoro inundando de granito o já afogado Jardim Pantanal... nada disso! O
enredo melodramático da nossa triste existência terá uma conclusão frugal, um
‘pronto cabô’ sem clímax nenhum, todos pegos desprevenidos pela força
devastadora da poeira assassina. São Paulo entrará para a história como a nova
Pompéia e escavações futuras revelarão nossos corpos petrificados nas poses
mais prosaicas, indicando que o curso da vida corria normalmente no instante em
que a nuvem negra baixava seu manto de morte sobre nós. Não, companheiro de
dor, não adianta gastar dinheiro com ventiladores ou circuladores de ar, ainda
que fosse possível instalar uma turbina de Boeing na sua sala, ainda assim o pó
daria conta de se esgueirar por entre as frestas do seu humilde e asséptico
lar! Passe o dedo em cima da televisão e verá! O pó em cima da televisão é a
segunda trombeta do apocalipse segundo São Paulo. Mas não se entregue,
lacrimejante irmão! Mesmo fossilizado, há que se preservar o respeito! O
passado de glória da raça humana tem o dever de, ao menos, servir de molde para
notáveis estátuas de pedra a serem expostas nos museus dos séculos seguintes!
Que o diga o peladão Davi de Michelangelo, pego desprevenido pelas cinzas do
Vesúvio enquanto interpretava uma peça antropofágica do Zé Celso. Portanto,
engula o soluço e vá ensaiando qual estátua humana quererá deixar como legado
para as gerações vindouras. Eu já decidi a minha! Vou ser desenterrado de
joelhos e com uma bíblia na mão, para provar que em vida fui um digno devoto do
Senhor e cabo eleitoral do Russomanno. Ah, triste presságio! Tanto tempo
trabalhando na escolha das palavras do meu nobre epitáfio e agora terei de me
contentar com um prosaico: COF! COF! COF! Foi Ivete Sangalo a primeira a nos
alertar sobre o epílogo dos sapiens. O ‘levantou poeira’ da musa do axé baiano
era um alarme profético que poucos levaram a sério. Por detrás do gingado da
arretada escondia-se uma Nostradamus-do-Acarajé! E não demos qualquer atenção. O
pó, sempre o pó a espreitar o nosso destino... e nós menosprezando a sua força
de extermínio. Oh pó! Minha consciência afunda-se em remorso. Passe a mão pela
consciência e verá. O pó de cima da consciência é a terceira e última trombeta
do apocalipse segundo São Paulo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário