Depois de mui meditar sobre o método que o levaria aos umbrais da eternidade - fosse aquela do subterrâneo sulfuroso, ou a do refrigerado teto celestial, tanto fazia -, Cornélio Clemente optou pela estricnina (havia gasto outro tanto bom tempo na pendenga em que o cianureto, de um lado, disputava sua preferência com a estricnina, do outro [tinha uma evidente queda por fármacos, herança dos tempos de leitura dos romances da famosa dama inglesa do crime]. Venceu a última, a estricnina, mas não por nocaute, e sim por pontos!) Mas que pudesse, ao menos, mirar o horizonte de sua abnegada varanda elevada pelos dois dígitos de andares! Era sua única exigência para consigo: morrer com os olhos lá adiante, afinal, se o gesto era deveras egoísta, que ao menos o foco estivesse em outra coisa senão em seu umbigo, equalizando assim a equação a que estava decidido por passar um traço. Levou, pois, o chá de camomila onde já havia ministrado o alvo pó, arauto do nunca-mais, ou do para-sempre, a depender do ponto de vista. Pois antes de sorver o cálido líquido envenenado, e radiante pela brisa fresca que lhe beliscava as bochechas, encostou-se tão precariamente na balaustrada que, não houve como impedir, desequilibrou-se e despencou. Uma verdadeira tragédia. Não deixa filhos, tampouco esposa. Somente uma xícara de chá envenenada e ainda fumegante, que, esperemos, evapore-se silenciosamente até que a fumaça se perca no fatídico horizonte, o mesmo cruel horizonte que matou desavisadamente esse que um dia fora Cornélio Clemente. Já não mais
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