O tal ator cujo nome não importa, irrelevante tanto no palco quanto na vida, passou sua cinza existência colecionando fracassos e abismos de crítica, até que, numa determinada noite, Astolfo, seu cão vira-lata de sarna às vistas e pata manca, que mui sabiamente era levado pelo próprio dono para esperá-lo no camarim, sendo ele, o cão vira-lata, o único diabo a lhe congratular com uma lambida o seu pífio desempenho sobre as tábuas da ribalta, escapou da coleira e foi querer experimentar as agruras do seu amo, servindo-lhe de antagonista. O tal ator cujo nome já o tempo apagou, vendo o bicho manquitolar feito um Ricardo III debaixo dos refletores, e ávido por um afago na orelha caída direita, soltou um berro trágico de 'fora daqui, seu quadrúpede miserável', no que fez imediatamente Astolfo congelar feito uma estátua de sal do antigo Egito. A plateia veio abaixo em urros e vivas, e o jornal estampou no dia seguinte a estrondosa interpretação que há tempos o teatro economizava aos seus tristes espectadores. Pois coube ao destino cerrar as cortinas para Astolfo, devolvendo ao ator cujo nome é tão desprezível quanto o seu passado inglório, a sua sina de padecer novamente na falta de talento, que somente um cão vira-lata pôde, um dia, reverter...
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